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#20 - ENCAIXANDO IDEIAS

  • Foto do escritor: viniciuscagnotto
    viniciuscagnotto
  • 29 de mar.
  • 3 min de leitura

Atualizado: 30 de mar.


Você tem em suas mãos um objeto. Ele é plano, pequeno, de formato irregular, mas que possui quatro extremidades. Em cada uma dessas extremidades existe ou uma protuberância arredondada ou uma reentrância em forma de curva. A sua parte plana é lisa e preenchida com cores quaisquer, que não te dizem nada nesse primeiro momento. Você não sabe muito bem o que fazer com esse objeto. Na mesa à sua frente há noventa e nove objetos parecidos.


Parecidos, mas não iguais.


Tamanhos sutilmente imprecisos, protuberâncias e reentrâncias minimamente diferentes, outras cores. Estão todos jogados, espalhados. Você não sabe nem por onde começar, mas também sabe que é possível organizar essa bagunça esquisita e sem sentido.


Então, estrategicamente, você pensa em algumas abordagens:


“E se, primeiro, eu separar em grupos de cores iguais ou aproximadas?”

“Parece que alguns objetos têm uma ou duas de suas extremidades lisas, o que parece significar algo. Devo separá-las do resto?”

“Se eu me preocupar agora com o tamanho levemente diferente, isso vai ajudar ou atrapalhar?”


Você precisa começar, então dá início ao primeiro passo da organização. Analisa, separa, reanalisa, erra, ajusta e termina. O que antes era um grande caos de objetos derramados sem ordenação, agora são diversos pequenos montinhos que, já de relance, entregam algum tipo de categorização.


Além disso, você tem um outro recurso auxiliar. Existe uma ilustração colorida que parece servir como guia. Ela é uma versão menor do que aquela organização deveria resultar após seu esforço nessa batalha e você pode consultá-la quando quiser. Que bom.


Pronto! Com o “Mise en place” em ordem, é hora de começar a cozinhar.

Mas não é tão simples, não basta colocar um objeto do lado outro que tudo se resolve.

Não, as protuberâncias e as reentrâncias têm padrões específicos que se conectam unicamente com seu par ideal.


Existe um direcionamento implícito na confusão de irregularidades.


Afinal, se todas as extremidades desses objetos fossem lisas, permitindo o pareamento livre entre eles, sem qualquer tipo de critério, qual resultado apareceria no final? Com certeza não àquele da ilustração guia e, provavelmente, algo inexplicável, sem nexo.


Com essa nota mental você heroicamente inicia o segundo passo. Você decidiu que é mais importante definir limites, então você se joga no agrupamento de objetos com algumas extremidades lisas, as entendendo como bordas, fins, que não se conectam com nada, ficam para fora. Logo, você tem à sua frente algo como um perímetro. Não foi fácil.


Mas a luta pelo posicionamento lógico dos objetos dentro do perímetro é ainda mais difícil e exige ainda mais concentração, análise e algumas vezes, tentativa e erro.

Aos poucos, os objetos vão se encaixando e pequenos setores de uma grande figura começam a aparecer. Isso te motiva a continuar.


Depois de algumas horas - período onde já sentiu orgulho, frustração, alegria, raiva, já xingou e também alegou que faltavam objetos, o que impossibilitaria continuar - você finalmente segura em suas mãos a última peça. Aquela que vai encerrar o árduo trabalho. Você a encaixa com um suspiro. O último buraco da grande figura é selado.


Foram necessárias cem peças singulares, individualmente sem sentido.

Cem peças, que quando unidas de forma lógica, através da racionalização de seus encaixes, fluíram para uma imagem cada vez mais compreensível.


A imagem final bela, é coerente, é significativa.

A imagem final, agora um símbolo de conquista, traz orgulho e satisfação.


Você está tão feliz pelo feito que cogita enquadrar para sempre essa imagem, de forma irreversível, de forma que nunca mais ela volte a ser as pequenas peças que um dia já foram, pois você, nesse momento, as odeia em silêncio. O que você ama é a imagem, o resultado.


Mas, enquanto estava segurando em seus pensamentos essa peça mental de extremidades protuberantes, outra delas apareceu, com reentrâncias arredondadas. Chegou voando e encaixou perfeitamente a primeira, levando à imagem de uma nova ideia.


Aquela figura sobre a mesa é fechada em si, possui limites, não há mais como continuar. Não há mais nada a se organizar. Talvez você não quisesse que acabasse. Será que a imagem final é tão relevante assim?


Em milésimos de segundo, uma nova peça aparece dentro da sua cabeça e mais uma vez o encaixe é perfeito, criando uma nova imagem, uma imagem de uma certeza, uma certeza tão cristalina que você precisa expressá-la.


Você começa imediatamente a desmontar tudo sobre a mesa, criando novamente uma confusão irregular e angustiante. Você sorri e diz com convicção:


“Acho que eu consigo montar a mesma imagem de novo, mas agora vou tentar com quinhentas peças”.


Deixa Eu Pensar | #20 - Encaixando Ideias

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